- Vamos ter que segurar no braço! Quebra o teto e puxa a corda! - disse Tom.
O um metro quadrado do elevador apertava os três. E Tom era o menos desesperado. Por algum motivo, o elevador parou entre 19º e o 20º andar e, depois de meia hora de sufoco, a desgraça: o cabo que suspendia o elavador iria romper. A ideia era simples: subir "na cobertura" do elevador para diminuir o "peso da gravidade" agarrando ao cabo como um macaco no cipó e, assim, puxar o elevador para cima para diminuir a pressão no cabo, enquanto Moacir e Verônica (dentro da "caixa") tentariam "rasgar" a porta e sair do elavador (ou pelo 19º ou pelo 20º andar - o que estivesse mais fácil). O revesamento no "cipó" (entre Tom e Moacir) daria tempo e esperança para se livrarem dessa. Já que o socorro não vinha, era o que melhor dava para fazer. Loucura? Quando se está entre a vida e a morte você esquece a loucura. Simplesmente vai lá e faz. E assim, Tom e seus amigos se safaram dessa.
Do lado de fora, a comitiva de imprensa os aguardava...
-Filhos da puta! - pensou Tom. A gente se fudendo lá dentro e a galera reportando nosso desespero?
De repente, um barulho de bípi pairava no ambiente. Seria uma bomba? O caos e a desordem tornavam o local selvagem. Era cada um por si e foda-se! O medo movia as pessoas que, desesperadas, esqueciam quem eram. As máscaras da honestidade, do amor, do status e da beleza eram pisoteadas pelo "bando neanderthal" que fugia do predador como os guinus esquivando-se dos leões. Alguns preferiram se atirar do 19º andar em que se encontravam. Outros preferiram esperar, provocar os limites e deixar a bomba explodir. Já Tom, depois de segundos de reflexão com passividade (em meio a uma leve apatia), dava gargalhadas no meio da confusão. Porém, eis que o impacto da explosão arremessou todos de forma aleatória para fora do prédio. Tom só teve tempo para olhar seus membros e pensar: ainda estou inteiro! Enquanto avistava um urubu planando no céu azul sem nuvens, a jornalista que Tom topara logo de cara quando saiu do elevador chocou sua bunda ao seu rosto de interrogação. Dessa maneira, no meio da "voadeira" Tom não enxergava mais o céu azul sem nuvens e nem o urubu. Tudo ficara escuro, mas com cheiro de jeans mulher. Logo depois, Tom conseguiu abrir os olhos. A bomba, mesmo explodida, continuava a bipar ao seu lado. Deitado, Tom esticou o braço, pegou a bomba (que era pequena e cabia em sua mão) e disse:
- 10h45!
Pensou um pouco, respirou, limpou a garganta com uma leve tosse forçada e usou "a bomba" para telefonar ao seu luthier...
- Ela tá pronta?! - perguntou Tom com voz de sono.
- Opa! É só vir buscar!
Lento como sempre, Tom foi ao banheiro lavar o rosto, olhar pra si e pensar: caralho! Depois da quinta "agüada na cara", repensou, abriu um sorriso e falou para si: saudades daquela biscate!
Lá pelas onze e tantas da manhã, ligou seu carro e foi à loja de música em que seu luthier trabalhava. Bem recebido, logo perguntou:
- Essa biscate te deu muito trabalho?
- Não. Os trastes estão bons. Só dei uma regulada na ponte e uma endireitada no braço.
Ela podia ser feia, mas era uma guitarra marcante. Assim que Tom a ligou no cubo da loja, todos pararam para ver sua beleza. Ela não gritava... Gemia como uma puta! E nas mãos de Tom, ela reconhecia a pegada firme do dono e gemia de um jeito peculiar.
A transa na loja durou até às 13h00. Tom foi para casa e lá a acareciou por mais duas horas. O negócio era fogo e álcool. Entre uma e outra transa, Tom ligara para um de seus companheiros de banda, chamando-o para "dar um chêgo em casa" e pegar umas músicas. O companheiro, que fora acordado pelo Tom, comprometeu-se a aparecer por volta das 15h00. Na ressaca do sexo, Tom e a biscate cantarolavam tristes uma canção. Os versos do refrão descreviam o momento...
Entre quatro paredes
sou mais um irmão
consumindo o vício
da solidão
Tom estava mal! Encarnava a letra e se sentia down... O dia acabava ali. O desânimo colocaria um ponto em seu final de semana - quando o telefone tocou. Era uma amiga chamando-o para tomar uma naquela tarde. Comprometido, Tom recusou ao convite, pois aguardava o companheiro de banda. Porém, eram quase 16h00 e nada dele aparecer. Obstinado a se automedicar, Tom ligou para a amiga aceitando ao convite. Em questão de meia hora estavam juntos tomando uma...
Papo vai, papo vem e um camarada apareceu. Os amigos e a cerveja nitidamente melhoraram o humor de Tom. Ele estava curado! Cerveja vai, cerveja vem e era hora de ir. O camarada se despedira e Tom foi para a casa da amiga. Ele sabia no que ia dar; sabia do "combate" que viria. Ela, que morava com a irmã e uma amiga (mãe de um filhinho de uns dois anos), estava com a casa liberada. Porém, Tom e ela não tiveram calma e começaram logo "a guerra". Momentos antes de Tom "lançar o míssil e derrotar o inimigo", ela ouviu uma voz de criança. Tom apressou-se e pôs um fim na "batalha". Enquanto "a Tia" fazia a recepção à criança, Tom mijava no banheiro. Ele ouvia seu telefone tocar lá do quarto, mas não podia atendê-lo. Não havia "como" sair dali no momento, porém, eis que a mão amiga da "Tia" bateu na porta e trouxe o telefone ainda tocando para Tom...
- E aí Cabeleira, tudo em cima? Cara... Eu sei que agora são 21h00, mas precisamos que você quebre uma pra gente! O cara do barzinho ligou e está sem banda pra hoje. Cê faz essa?
Se fosse minutos antes - e caso Tom atendesse ao telefone - certamente Tom iria mandar o amigo "tomar no cu" (no bom sentido da camaradagem, claro!), mas como o cara ligou na hora certa, Tom aceitou. Não era a banda de Tom, mas ele sabia improvisar e conhecia o repertório dos caras. Só tinha um porém: o Tom estava bêbado e gozado (entenda como relaxado e sujo). A amiga não poderia acompanhar Tom nesta empreitada. Sem problemas! Tom foi ao seu apartamento pegar a biscate e, de lá, foi às pressas ao barzinho. Tom Cabeleira não esquecera o Velho Jack. Com as heróicas seis doses ainda sobreviventes na garrafa transparente, Tom se direcionou ao palco. O cara que ligou para o Tom logo disse:
- Êêêê Tom... Trouxe a pinguinha? É isso ae!
Tom não respondeu nada, pois não queria dar uma de chato. Mas pensou:
- Chamar o Velho Jack de pinga é dose hein! Por falar em dose...
A golada foi purificadora! Reabastecido com o álcool, Tom encorajava os primeiros acordes da banda. Era uma situação estranha, pois pela primeira vez naquele "boteco" Tom percebia o público frio. Já fizeram shows piores lá, mas mesmo assim a galera ficava enérgica. Talvez fosse o horário, afinal, sendo chamados de última hora, a banda começara a tocar tarde (por volta das 23h30, quando o normal da casa é as 22h00). Mas Tom não queria nem saber, já estava gozado e iria receber mais pelo "de última hora". Tom não precisava de mais nada, mas...
Como a banda começou tarde, não fariam intervalo. O show seria numa porrada só. Mas vale a pena lembrar que Tom sempre repudiou esta hisória de bandas fazerem intervalos durante os shows. Não achava isto rock and roll! Portanto, Tom estava mais confortável. Acabaria o show, pegaria a grana e terminaria a noite. Porém, eis que uma "a conheço de algum lugar" o fitava no palco. Morena e sem muita "chamação", parecia ser alguém que Tom conhecera na escola ou no cursinho - oito ou nove anos antes. Como todo bom ator no palco, Tom interagia com o publico e, é claro, com a morena.
- Aí galera! Valeu por terem ficado até o fim! Agora nós vamos mandar nossa saidera. Valeu! - anunciava o vocalista.
E depois da última, Tom foi para a cerveja, afinal, o guerreiro Velho Jack jazia no canto do palco esquecido e vazio. Obviamente, Tom foi matar a curiosidade. Porém, antes de Tom perguntar ou deixar entender que já conhecia a morena, ela revelou ser a recepcionista de onde uma ou duas vezes ao ano Tom corta o cabelo. E depois daquele papo chato de nossa que cabelo bonito, não corta e não sei que lá, Tom finalmente englobou a morena e, por osmose, regou as células gustativas de sua língua. Claro que Tom tentou arrastá-la ao seu apartamento, mas a moça era certinha demais.
Um dos caras da banda se aproximou dos dois e disse ao Tom: vamos voltar. Tocar mais uma meia horinha que a galera tá afim. Tom que não estava mais nem aí pra nada, disse: beleza meu. Rock n´ roll!
E voltaram! Durante a meia horinha final, a morena se despediu de Tom ainda no palco. Pronto! Era o fim da noite... Que nada! No meio da "guardação" das coisas, entre o vai e vem do carro para o palco, Tom trombou com duas garotas: uma loira e uma morena de vestido curto-colado preto. Educado que só, Tom cumprimentou com a cabeça as damas. Que retribuíram. Principalmente, a loira.
Nessa vida do jogo de conquista, Tom sabia que não dava pra ficar escolhendo. A que estivesse mais no jeito, ia. Mesmo porque, o Cabeleira não tem muita paciência para charmes que não virarão nada. Se for apenas questão de tempo, Tom tem toda a paciência do mundo para chegar nos finalmente. Mas quando o charme é de pura frescura, Tom dispensa logo de cara. A loira fez um charminho gostoso; a de vestido curto-colado, foi recepitiva e respeitou a amiga, ficando na dela. Tom ainda chamou o vocalista da banda para se juntar ao grupo e "cedeu" a de vestido curto-colado ao amigo. Que não virou nada, já Tom...
- Blá-blá-blá, blá-blá-blá e blá-blá-blá, tchau! Temos que ir! - disse a loira.
E no clássico beijinho no rosto de despedida, Tom mirou a boca da loira. Que desviou. Nem aí, Tom foi falar tchau para a morena de vestido curto-colado preto. E claro, mirou a boca dela também. Nada de novo... Nesse espaço de tempo, rolou um blá-blá-blá final e... Bingo! Tom beijara a loira. Aí o ir embora enrolou-se mais um pouco até que, finalmente, Tom e a loira se desgrudaram. Feliz, Tom voltou aos seus afazeres de desmontagem de equipamento. No palco, Tom estava sozinho e longe dos poucos que ainda restavam na casa - inclusive as duas amigas (rodeadas por "urubus mais novos"). Tom olhava as duas de longe e tinha certeza que um dos "urubus" estava "catando" a de vestido curto - mesmo não vendo amassos. Virou as costas e continuou a desmontar o seu equipamento. Segundos depois, essa de vestido-curto colado passou ao lado de Tom rumando ao banheiro feminino. Detalhe: sozinha. Tom analisou a situação e pensou:
- Quer saber? Existe 50% de probabilidade de ela realmente querer ir ao banheiro. Porém, existe os outros 50% de probabilidade de ela estar fazendo graça. Eu vou catar essa mina!
Como um felino à espreita, Tom esperou a morena de vestido curto-colado sair do banheiro. O cavalo da oportunidade passa uma vez só - pensava. E ela saiu do toalete. Tom não perdeu tempo:
- Oi! Tava te esperando sair!
- Como? - respondeu ela.
- Pra te falar tchau de novo... - Tom.
Nessa altura, Tom e a de vestido-curto colado já estavam próximos um do outro atrás de um pilar da largura de um box de banheiro. E sozinhos! Com a mesma tática velha e furada do beijinho no rosto na hora do tchau, Tom mais uma vez avançou nos lábios da menina. E mais uma vez ela tirou a boca da reta.
- Só um beijinho, baby! - choramingou Tom que insistia... - Dá uma olhada ao seu redor. Estamos sozinhos aqui. Ninguém vai ver...
Ela relutava com "aquele não de mulher" e Cabeleira, reconhecendo o tom sim do não, não se deu por vencido. E ela liberou um selinho.
(É pênalti! Agora só depende do craque...).
- Só um selinho? Me dá um beijo de verdade! - Tom.
- Mas você acabou de ficar com a minha amiga... - ela.
E os anos de experiência fizeram diferença quando Tom lhe respondeu:
- Mas você sabe que eu estava mirando você, né?
E ela se jogou com uma louca apaixonada em cima de Tom. Beijava-o de uma maneira que parecia engolí-lo. As mãos dela passavam no rosto dele e o arranhava perto do olho direito. Só pode ser um orgasmo! - conseguia refletir Cabeleira. Nem sua experiência esperava uma reação tão quente e ardente; uma resposta enlouquecedora. Tom gostava e queria mais! E só o pilar era testemunha. E na relatividade do tempo, aqueles poucos minutos viraram horas. Que delícia! Mas era hora de parar... Tom precisava dizer uma despedida marcante; cravar a vitória no peito. E ele se valeu de uma última tacada... Com cara de canalha, disse a ela, que já estava a um metro e meio de distância:
- Se alguma coisa valeu a pena essa noite, foi você gracinha!
Mandou um beijo no ar e se virou em direção ao palco - voltando aos seus afazeres como se nada tivesse acontecido. De lá, ele olhava os "urubus" de longe e pensava: Cês são novos molecada...
E quem disse que elas foram embora? Continuaram por lá. Tom Cabeleira estava nitidamente satisfeito e se aproximou dos caras da banda - que acertavam o cachê com o dono da casa. E eles estavam perto dos "urubus" (por volta de cinco) que aguardavam as duas amigas. Então, as duas ressurgiram do nada e, passando por Tom, a loira parou; a de vestido curto-continou seu rumo. A loira lhe pressionou:
- Você ficou com a minha amiga, né?
Provavelmente ele fora delatado, mas Tom preferiu dar uma de "joão sem braço"...
- Imagina, meu amor! Que isso...
- Ficou sim!
Nitidamente querendo mostrar para a outra que ela era a melhor, a loira agarrou Tom e sacou-lhe um amasso daqueles. A de vestido curto-colado viu o ato e respondeu. Pegou um "urubu" de camiseta vermelha e deixou que ele a beija-se. Tom não teve tempo para senitr ciúmes da de vestido curto-colado. Ou seja: "deixou o pau torar". Numa brecha de intervalo, Tom se virou para os colegas de banda e continou acertando o cachê. Um dos "urubuzinhos" foi parabenizar a mesma e se despedir da banda. Ele bateu as mãos no ombro esquerdo de Tom e, em sinal de respeito e admiração, falou-lhe:
- Cara... Cê é foda!
Qualquer homem sabe que, se outro homem o elogia, é porque o negócio é muito sério. O instinto paterno de Tom, aflorado pela bebedeira, se manifestou em pensamento quando ele sentira a vontade de adotar o "urubuzinho" e lhe ensinar o como se faz. Afinal, com certeza o "urubuzinho" só teria visto Tom com a primeira morena (que já havia ido embora) e a loira. Se ele soubesse da amiga que o convidara a tomar uma cerveja de tarde e da de vestido curto-colado, sem dúvidas mandaria erguer uma estátua de bronze em homenagem ao Tom Cabeleira...
De volta a loira, mais um amasso surgiu e de novo aquele papo do você ficou com a minha amiga, canalha!
- Mas tudo bem. Eu não ligo. - disse a loira.
O que mais de bom poderia acontecer naquela noite?
- Ah é?! Então vamos nós três para o meu apartamento. - insitou Tom...
por HUGO PEZATTI
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