quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Do Interior Para Fora (ou seria o contrário?)

Tenho até medo de “dar a ideia”. Porém, a ideia já existe e já se propaga. Meu medo então (parando pra ver) é o de ajudar a propagar essa ideia. Mas por outro lado, alguma coisa deve ser feita.
Não me recordo e nem sei como chegamos ao ponto que estamos, mas não podemos continuar! Não é bom! É horrível para as bandas! Ah sim... Do que estou falando? – deve estar se perguntando.
Acerca de 15 anos, bandas que ainda engatinhavam tinham a oportunidade de se apresentarem em São José do Rio Preto-SP. Digo com conhecimento de causa, afinal, o baixista da minha banda atual tocara na saudosa Sarcasmo e, um dos meus melhores amigos era vocalista da antiga banda Rules. Ambos tiveram a oportunidade de pisar nos palcos do Olaria (casa que melhor acolheu o rock por aqui) em meados dos anos 90.
Quando me projetei no cenário rock underground rio-pretense (comecinho de 1998), o Olaria já não funcionava mais. Porém, esta casa dava cachê para as bandas - além da oportunidade de apresentação. E volto a repetir: cachê para bandas que ainda engatinhavam em S. J. Rio Preto.
Um dos espectadores da Rules no Olaria era um cara chamado Rodrigo Braida. Sem medo algum de afirmar, Braida disse várias vezes que sua banda (Nevrose) fora inspirada na antiga Rules. Infelizmente, tais bandas nunca tiveram a oportunidade de dividirem palco, pois a Rules terminara antes do Nevrose se projetar, no entanto, o Nevrose foi outra prova de que tempos melhores existiram nesta cidade.
Chácara, som de primeira, aglomeração que variava de 1.500 a 3.000 pessoas e rock n´ roll. Este fora o ambiente que projetou o Nevrose que embalava as gloriosas festas do Cacaco. Algumas delas: Junta Tribo, Contato (sim, rolava rock), Rock n´Vou – 4 edições, Festival na Pista de Skate do Tom e muitos tributos ao Raul Seixas e um à Cássia Eller. E nunca o Nevrose ou qualquer outra banda já citada tiveram que pagar para tocar.
No segundo parágrafo eu disse não saber, porém, refletindo por um instante, talvez a causa dessa desgraça toda tenha sido a tal da “camaradagem” que, gradual e impensada, fudeu com tudo. Digo isso, pois, da tal da “camaradagem” (coisa muito comum entre as bandas) deve ter surgido o tal do “Tó! Vende os ingressos aí pra ajudar! Aproveita e fala que tua banda vai tocar!”.
Uma ideia simples e ingênua. Nasceu da protocooperação entre a banda (que teria um público para quem tocar) e o dono do evento (que lucraria com a portaria e o bar). Posteriormente, a protocooperação deve ter dado lugar ao parasitismo que, por sua vez, deve ter cedido ao predatismo (pelo menos é o que se constata) onde o único beneficiado é o dono do evento, ficando as bandas subordinadas a ele em uma condição de servidão. Historicamente é como se o palco fosse a banalidade feudal. Ah! O público também e etc.
Em suma: no cenário do rock underground, as bandas - além de não receberem cachê e nem água durante sua apresentação - têm que pagar para tocar. Funciona assim: estipula-se um limite de ingressos a serem vendidos por cada banda e, não tendo vendido todos os ingressos, os integrantes rateiam a diferença para terem sinal verde de show. A-B-S-U-R-D-O! Isto também vale para abertura de shows de bandas grandes. Só que nestes casos as cobranças são mais descaradas e caras!
Voltando ao passado... Nevrose, Arcádia, Raising, Savagery Mal do Século e Acustic Work tocaram ao lado de Engenheiros do Havaí, Ultraje a Rigor, Ira! e Raimundos no Rock In Rio Preto (março/2001) e não desembolsaram um tostão. O lance era mais “darwinístico”: as bandas que mais ralavam e se destacavam eram as selecionadas. Ponto.
Já no presente, o que está rolando é uma marginalização das bandas. Toca quem tem grana para tocar. Nos anos 70, essa marginalização acontecia, pois os instrumentos eram caros, sendo poucos os que tinham condições de montarem uma banda. Hoje, esta marginalização acontece, pois poucos podem pagar para tocar. E depois as pessoas se perguntam por que o rock está tão careta... É óbvio! A rebeldia vem das ruas, da revolta, das gerais da polícia, da escola fudida, do álcool proibido, dos vizinhos chamando “os homi”, da sarjeta, da madrugada embriagada, das voltadas a pé, do ônibus, da sujeira, do faça você mesmo, da zona, das chácaras, do Zeus e da puta que pariu! Vejam só...
A faculdade me afastou 4 anos do rock rio-pretense. Quando voltei, estranhei. O evento começava às 20h00 e cheguei lá às 23h00 (como de práxis). O problema é que o evento realmente começou às 20h00 e às 0h00 não havia mais nada. Pensei: como o rock está comportado! Antigamente virava-se a madrugada. Pois bem, na época do fatídico evento (meu amigo Marcello Dallas estava comigo e não me deixa mentir) não consegui achar uma explicação, mas hoje tenho: jovens comportados geram o rock comportado. Tempos atrás eu diria que era a violência, mas, na real, a internet prende os jovens em casa que, sem contato com a rua viram caretas (pessoas comportadas). É como um gato doméstico ou um cachorro: se criados em casa (confinados em um ambiente fechado) podem ficar dóceis e amáveis; já na rua ficariam mais espertos, malandros, astutos e audazes. O rock elitista é dócil e amável (caso do Emo e todas as suas ramificações) e é ele quem está em evidência, pois é ele quem pode pagar, capice? Pelo menos aqui em S. J. Rio Preto. Se bem que acredito ser assim em outros lugares também...


HUGO PEZATTI é fundador e baterista da banda Pronúncia, historiador graduado pela unesp de Franca, professor do ensino fundamental, médio e cursinho e ex-integrante e fundador da extinta banda Nevrose. E-mail: pronunciarock@yahoo.com.br

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